Esse é o adjetivo que consegue resumir com precisão o que foi a primeira hora de The Leftovers, nova série da HBO. Baseada no livro homônimo, escrito por Tom Perrotta, a série mostra a humanidade três anos após um evento misterioso que fez com que 2% da população do planeta desaparecesse. Essa catástrofe em escala mundial provoca as mais variadas reações nas pessoas, que além de terem de lidar com a dor da perda das pessoas queridas, se veem repletas de dúvidas sobre o que de fato ocorreu, os porquês e, principalmente, como superar a situação.
Damon Lindelof, conhecido por ser co-criador de Lost, assume o cargo de produtor e roteirista de Leftovers, o que pode acabar afastando e desencorajando muita gente, que até hoje não engoliu o final da série da ilha misteriosa. Confesso que também estava com bastante receio e, por esse motivo (além de não querer ser vítima de possíveis spoilers) procurei o material original. Ao fim da leitura do livro de Perrotta, que já foi lançado aqui no Brasil com o título Os Deixados Para Trás, ficou bem claro pra mim que, no fim das contas, a intenção não era desvendar o mistério sobre o tal arrebatamento, mas sim a de mostrar a vida dessas pessoas que "sobraram". Sabendo disso e dando uma chance pro Lindelof após esse texto muito bacana do NY Times, decidi receber a série de braços abertos. E fui presentado com uma belíssima premiere.
Assim como acontece no livro, a adaptação televisiva dá destaque à família Garvey, que não teve nenhum membro arrebatado pelo evento, mas sofreu mudanças diretamente ligadas a ele. Kevin (Justin Theroux) é o chefe de polícia (e eye candy) da comunidade de Mapleton, local onde a trama mantém seu foco. Ele e a filha, Jill (Margaret Qualley) são os únicos membros remanescentes, já que Tom (Chris Zylka) abandonou a faculdade para seguir um homem que se proclama como um novo profeta e Laurie (Amy Brenneman) abandonou a família para viver com um grupo de pessoas conhecido como Guilty Remnant (Remanescentes Culpados, numa tradução literal). É interessante observar que, nesse início, a não ser por Laurie, todos eles demonstram certo desconforto com suas vidas e têm sérias dificuldades de lidar com essa nova dinâmica familiar. Vamos ver o quê e onde esse sentimento levará os quatro.
Além deles, podemos destacar duas personagens que provavelmente terão um desenvolvimento maior na trama: Nora e Meg. A primeira delas, interpretada por Carrie Coon, perdeu a família inteira no arrebatamento. Já Meg, vivida por Liv Tyler, é uma das pessoas que não consegue viver normalmente após o evento e busca refúgio com os membros do Guilty Remnant, que não vou falar muito ainda para evitar possíveis spoilers. Digamos que o principal objetivo deles é impedir que as outras pessoas prossigam com suas vidas, forçando-as a relembrar do evento traumático de três anos atrás.
Como deu pra notar, esse evento traz uma forte semelhança ao arrebatamento bíblico, onde acredita-se que as pessoas fiéis e merecedoras serão levadas para um plano espiritual, deixando para trás as condenadas. Esse fato por si só já acaba contribuindo para evitar muitas teorias viajadas e mirabolantes (como costumava ocorrer em Lost), mas Lindelof também alimenta a parcela do público que se interessa e gosta de mistérios. O mais evidente no primeiro episódio fica por parte do grupo de cães, que sem a presença de seus antigos donos, acabam se entregando aos instintos mais selvagens - que um dos personagens, em determinado ponto do episódio, já comenta sobre e menciona uma possível explicação.
Embalado por uma trilha sonora envolvente (com ressalva para a faixa 'Retrogade', do britânico James Blake), direção e montagem inspiradíssimas, The Leftovers chega com um grande potencial. E se depender da premiere, pelo menos, Damon Lidelof já tem o meu perdão pelos seus erros.
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